quarta-feira, 30 de março de 2016

RESUMO DO LIVRO DE NICOLAU MAQUIAVEL: O PRÍNCIPE



- Aos 29 anos de idade, Nicolau Maquiavel ingressou na vida política, exercendo o cargo de secretário da Segunda Chancelaria da República de Florença. Porém, com a restauração da família Médici ao poder, Maquiavel foi afastado da vida pública. Nesta época, passou a dedicar seu tempo e conhecimentos para a produção de obras de análise política e social.


- Em 1513, escreveu sua obra mais importante e famosa “O Príncipe”. Nesta obra, Maquiavel aconselha os governantes, em especial o Príncipe Lorenzo de Médici, como governar e manter o poder absoluto, mesmo que tenha que usar a força militar e fazer inimigos. Esta obra, que tentava resgatar o sentimento cívico do povo italiano, situava-se dentro do contexto do ideal de unificação italiana. 



- O livro "O Príncipe" foi escrito por Nicolau Maquiavel em 1513, cuja primeira edição foi publicada postumamente, em 1532.


- Trata-se de um dos tratados políticos mais importantes já escritos, e que tem papel crucial na construção do conceito de Estado como modernamente conhecemos. 
- Entre outras coisas, descreve as maneiras de conduzir-se nos negócios públicos internos e externos, e fundamentalmente, como conquistar e manter um principado

- O livro “O Príncipe” é um manual prático que foi dado como presente por Maquiavel ao Príncipe Lorenzo de Médici.

Príncipe Lorenzo de Médici

- A obra envolve experiência e reflexões do autor. 

- Maquiavel analisa a sociedade de maneira fria e calculista e não mede esforços quando trata de como obter e manter o poder.

- Questão: como constituir e manter a Itália como um Estado livre, coeso e duradouro? Ou como adquirir e manter principados?

- A tirania é apresentada por Maquiavel como uma resposta prática a um problema prático 

- No livro “O Príncipe” não há considerações de direito, mas apenas de poder: são estratégias para lidar com criações de força.


- Teoria das relações públicas: cuidados com a imagem pública do governante.
- Teoria da cultura política: religião nacional, costumes e ethos social como instrumentos de fortalecimento do poder do governante.
- Teoria da administração pública: probidade administrativa, limites à tributação e respeito à propriedade privada. 
- Teoria das relações internacionais: Exércitos nacionais permanentes, em lugar de mercenários. Exercito nacionais para conquista, defesa externa e ordem interna.


- Em sua obra “O Príncipe”, Nicolau Maquiavel mostra a sua preocupação em analisar acontecimentos ocorridos ao longo da história, de modo a compará-los à atualidade de seu tempo.

- A obra é dividida em 26 capítulos, que podem ser agregados em cinco partes, a saber: 
*capítulo I a XI: análise dos diversos grupos de principados e meios de obtenção e manutenção destes;
*capítulo XII a XIV: discussão da análise militar do Estado; 
*capítulo XV a XIX: estimativas sobre a conduta de um Príncipe; 
*capítulo XX a XXIII: conselhos de especial interesse ao Príncipe; 
*capítulo XXIV a XXVI: reflexão sobre a conjuntura da Itália à sua época.

- Na primeira parte (cap.I a XI), Maquiavel mostra, através de claros exemplos, a importância do exército, a dominação completa do novo território através de sua estadia neste; 

- Mostra a necessidade da eliminação do inimigo que no país dominado encontrava-se e como lidar com as leis pré-existentes à sua chegada;

- Dava o consentimento da prática da violência e de crueldades, de modo a obter resultados satisfatórios, onde se encaixa perfeitamente o tão famoso postulado atribuído a Maquiavel de que “os fins justificam os meios” como os pontos mais importantes. 

- A guerra é a verdadeira profissão de todo governante e odiá-la só traz desvantagens.


- Já na segunda (cap.XII ao XIV), reflete sobre os perigos e dificuldades que tem o Príncipe com suas tropas, compostas de forças auxiliares, mistas e nacionais, e destaca a importância da guerra para com o desenvolvimento do espírito patriótico e nacionalista que vem a unir os cidadãos de seu Estado, de forma a torná-lo forte. 

- Do capítulo XV ao XIV, vê-se a necessidade de certa versatilidade que deve adotar o governante em relação ao seu modo de ser e de pensar a fim de que se adapte às circunstâncias momentâneas.

- ”Qualidades”, em certas ocasiões, como afirma o autor, mostram-se não tão eficazes quanto “defeitos”, que , nesse caso, tornam-se próprias virtudes; 

- O obra também fala da temeridade dele perante a população quanto ao sentimento de afeição, como medida de precaução à revolta popular, devendo o soberano apenas evitar o ódio; 

- Fala da utilização da força sobreposta à lei quanto disso dependeram condições mais favoráveis ao seu desempenho; 

- Também fala da importância da sua boa imagem em face aos cidadãos e Estados estrangeiros, de modo a evitar possíveis conspirações.

- Em seguida, constata-se um questionamento das utilidades das fortalezas e outros meios quanto a finalidade de proteção do Príncipe; 

- Depois ele disserta sobre o modo como o principe encontrará mais serventia em pessoas que originalmente lhe apresentavam suspeita em contrapartida às primeiras que nele depositavam confiança; 

- Indica como o príncipe deve agir para obter confiança e maior estima entre seus súditos; 

- Fala sobre a importância da boa escolha de seus ministros;

- O livro se apresenta como uma espécie de guia sobre o que fazer com os conselhos dados ao príncipe. Conselhos estes que são raramente úteis, quando levamos em consideração o interesse oculto de quem os dá. 

- Na última parte, que abrange os três capítulos finais, Maquiavel foge de sua análise propriamente “maquiavélica” na forma de um apelo à família real, de modo que esta adote resoluções em favor da libertação da Itália, dominada então pelos bárbaros. 

Documentário: O Príncipe (Nicolau Maquiavel)

- Terminada a breve exposição dos principais temas abordados no livro “O Príncipe” aqui sintetizado, conclui-se ser tamanha a complexidade organizacional de um Estado, que se recorre a todo e qualquer meio, justo ou injusto, da república à tirania, para ter-se como consequência não um país justo no sentido próprio da palavra (ao menos não se julga, habitualmente, haver uma possibilidade de fazer-se justiça com relação a todos os integrantes de uma sociedade ou grupo de extensão considerável, já que os interesses são os mais variados), mas estável, governável e próprio de orgulho por suas partes e, principalmente, de respeito perante aos demais países/nações, o que certamente propiciaria um meio sadio e mais tranquilo de viver-se, tanto ao Príncipe quanto aos seus seguidores.



- Em função das idéias defendidas no livro “O Príncipe”, o termo “maquiavélico” passou a ser usado para aquelas pessoas que praticam atos desleais (até mesmo violentos) para obter vantagens, manipulando as pessoas. Este termo é injustamente atribuído a Maquiavel, pois este sempre defendeu a ética na política.



"Precisando um príncipe de saber usar bem o animal, deve tomar como exemplo a raposa e o leão; pois o leão não é capaz de se defender das armadilhas, assim como a raposa não se sabe defender dos lobos. Deve, portanto, ser raposa para conhecer as armadilhas e leão para espantar os lobos."

Niccolo Maquiavel

A forca física do leão, e a sagacidade da raposa.

Referência:

MAQUIAVEL, Nicolau. O Príncipe: comentários de Napoleão Bonaparte. Tradução Edson Bini. 12. ed. São Paulo: Hemus, 1996.

Disponível em:
www.blogdoprofessorhenry.blogspot.com

Resenha do livro "O Príncipe" de Nicolau Maquiavel

É importante ao falarmos da obra prima de Nicolau Maquiavel, “O Príncipe”, atentarmo-nos para a sua finalidade prática. Em 1512, o italiano havia sido exilado e destituído de suas funções públicas após a tomada do poder de Florença pela família Médici. Como uma forma de conquistar a graça dos novos governantes e, assim, retomar o seu antigo posto, Maquiavel escreve “O Príncipe” em dedicatória a Lourenço de Médici.
O livro, que assume a forma de um manual do bom governante, se inicia como uma classificação dos tipos de governo e da melhor maneira de conquistá-los. Aí, o autor já apresenta o seu argumento e, de forma a corroborá-lo, uma grande amostra de exemplos, citando desde romanos até os gregos e os próprios italianos. É assim que Maquiavel nos mostrará uma de suas mais singulares características: a preocupação pela história e, de certo modo, pela empiria.
A seguir, o florentino exporá uma parte importante do seu raciocínio retomada ao final do livro, que se refere a dois conceitos chaves: a virtù e a fortuna. Segundo o autor, a transformação de um homem em um príncipe se daria por duas formas – pelos seus méritos próprios ou pela sorte. Conquistar um principado por méritos próprios seria mais dificultoso, mas mais facilmente se daria a sua manutenção. O contrário aconteceria com que aqueles homens que o fizessem através da fortuna ou do mérito alheio.
Aqui é importante frisar que o conceito de virtù não se assemelha em nenhum aspecto às virtudes cristãs e tampouco temos a fortuna como sinônimo de desígnio divino. O autor, contrariando a mentalidade típica de sua época, elabora a imagem do homem que não está sob o jugo da divina providência, mas que é sujeito da história. Dessa forma, faz uma retomada aos clássicos, movimento característico do humanismo, e resgata a figura da fortuna como uma deusa aliada daqueles de virilidade suficiente para conquistá-la. Tal como uma mulher ela seria seduzida pelos jovens, aqueles mais arrebatados e de maior vir.
Outro capítulo interessante é aquele que se intitula: “daqueles que se fizeram príncipes mercê de suas atrocidades”. Afim de melhor explicar seu raciocínio, o italiano dará o exemplo de Agatócles, que, por meio de inumeráveis crueldades, se fez respeitado. Para Maquiavel, o uso da virtù não nos permite inferiorizá-lo com relação a nenhum outro capitão, e, no entanto, a sua desumanidade e a falta de características virtuosas não fazem com que possamos classificá-lo como glorioso. Ainda assim, o autor caracterizará duas formas de crueldade: as proveitosas, das quais se faz uso uma única vez por motivos de segurança, e as contraproducentes, utilizadas de forma indiscriminada e paulatinamente.
São idéias como essa que abrirão caminho mais tarde para a célebre discussão sobre a moralidade nos escritos de Maquiavel: seria o autor um amoral, uma vez que coloca ética e política em planos distintos; teria sido um moralista peculiar, tendo em vista que não abdica completamente dos valores de sua época, fazendo uso dos termos “bem” e “mal”, “lícito” e ilícito”; ou, ainda, um pensador que propunha uma moral diferente, onde predominaria a busca pela glória em detrimento das virtudes cristãs?
O próximo passo será falar da arte da guerra, tema de inúmeros outros escritos de Maquiavel. O italiano preconizaria um príncipe que tivesse como única atividade a preocupação pelos exercícios militares. Isso se deveria ao fato da inconfiabilidade dos exércitos mercenários, que seriam vis, indisciplinados e infiéis, capazes de mudar de lado caso tivessem a garantia de maiores de salários. Assim, o príncipe que dependesse desse modelo de tropa, ou, exclusivamente, da sua fortuna, estaria fadado à ruína.
A seguir, o florentino discorrerá sobre o que chamamos “a verdade efetiva das coisas”, ou seja, de que devemos tratar do mundo como ele realmente se apresenta diante de nós. Aquele que se preocupa mais com o “dever ser” do que com o “ser”, caminharia, infalivelmente, para a ruína. Esse ponto merece grande atenção, uma vez que através dele surge a figura do Maquiavel realista em oposição a muitos autores considerados utópicos, como Tomás Morus e, mais tarde, Rousseau.
A partir desse ponto é que devemos entender a defesa do italiano pela praticidade das ações do príncipe, que não deveria fiar-se em atitudes consideradas “éticas” caso essas colocassem em risco a própria segurança do Estado. Dessa forma, o soberano deveria tentar ser, ao mesmo tempo, temido e amado, devendo optar, no entanto, pela primeira característica no caso de ter de escolher.
Essa constatação é conseqüência da sua concepção de natureza humana. Sendo ela essencialmente má os homens se afastariam do príncipe em sua primeira necessidade, de forma que o soberano nunca poderia contar com a sua palavra. Tal indução no que toca à natureza humana  seria mais tarde retomada por autores como Thomas Hobbes.
Outra metáfora de que se utilizará Maquiavel e que tem origem em escritores clássicos é a da raposa e do leão. Para o autor, não bastaria que o príncipe fosse essencialmente forte, como o leão, mas que tivesse atributos da raposa, famosa pela esperteza e dissimulação. Dessa forma, o soberano, apesar de nem sempre contar com as virtudes cristãs, deveria fingir tê-las de modo a enganar seus súditos. Mais uma vez, Maquiavel rompe com a moralidade típica do medievo, propondo outro sistema de valoração.
Assim, Maquiavel entende que é importante que o príncipe seja bem-quisto não devido a uma ética transcendental, mas porque assim a manutenção do Estado se daria de forma mais fácil. Apesar de muitas vezes temido, portanto, é necessário que o soberano não fosse odiado. Tal sentimento por parte do povo poderia ser evitado caso se respeitassem, principalmente, a sua propriedade e as suas mulheres.
Por fim, Maquiavel falará sobre a unificação da Itália, motivo pelo qual a maioria dos estudiosos atribui a preocupação do italiano por instituir aí um poder forte e coeso. A Itália subdivida em muitas repúblicas e principados era o cenário de sangrentas batalhas, que poderiam ser evitadas, na visão de Maquiavel, caso se firmasse um governo soberano. Em certo sentido, portanto, é o florentino um dos precursores da idéia de Estado moderno desenvolvida posteriormente.

Disponível em: www.arcos.org.br




  

terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

A IMPORTÂNCIA DA FILOSOFIA PARA A VIDA COTIDIANA

A indagação mais corriqueira a alguém que se diga estudante de filosofia ou mesmo Filósofo é uma pergunta que já traz em si um caráter filosófico: para que serve a filosofia? Este enfoque é chamado em Filosofia de enfoque Utilitarista. O Utilitarismo é “uma doutrina ética que prescreve a ação (ou inação) de forma a otimizar o bem-estar do conjunto dos seres sencientes[1]. O utilitarismo é então uma forma de consequencialismo, ou seja, ele avalia uma ação (ou regra) unicamente em função de suas consequências.Filosoficamente, pode-se resumir a doutrinautilitarista pela frase: "Agir sempre de forma a produzir a maior quantidade de bem-estar (Princípio do bem-estar máximo)”.

Seus organizadores foram “Jeremy Bentham (1748-1832) e John Stuart Mill (1806-1873) que sistematizaram o princípio da utilidade e conseguiram aplicá-lo a questões concretas – sistema político, legislação, justiça, política econômica, liberdade sexual, emancipação feminina”.

Muito importante na história do Direito, o Utilitarismo tem uma qualidade que é ao mesmo tempo seu maior defeito: o racionalismo. Ele implica que cada gesto seja devidamente calculado e é exatamente aí que ele falha, já que, já que é uma linha de pensamento consequencialista, que considera fundamentais todas, e eu repito, todas as consequências de um ato , falha na medida que é impossível ter certeza de todas as interações possíveis de determinado gesto, ou seja, queiramos ou não, sempre teremos que pagar um tributo à incerteza e a imprevisibilidade.

                                                                Jeremy Bentham

Talvez por isso muitos o critiquem, só que como todas as linhas de pensamento geradas a partir do exercício da filosofia por seus diversos autores, o utilitarismo deixou sua cicatriz na vida da sociedade e assim perguntas como “ para que serve a filosofia” são feitas , na concepção ingênua de que seja espontânea e que não tenha já em si, um viés filosófico.
                                                             John Stuart Mill

Este é o primeiro aspecto da interveção do pensamento filosófico na vida social: por decantação, milênio após milênio, em tempos menos cultos e depois com o avanço da velocidade da informação e do conhecimento, século após século, depois década após década, filósofos elucidam interpretações originais da realidade, primeiro discutindo-as com seus pares e, lentamente, deixam que elas se derramem sobre as mentes de todos os seres humanos em todas as partes do planeta.

Todos nós julgamos, e achamos que julgamos, qyue estabelecemos juízos sobre as coisas que nos acontecem de forma espontânea, dada, como dizemos em filosofia. Só que não é assim. Um pensador treinado nas muitas escolas de pensamento saberá reconhecer no discurso ou nos atos de alguém ou de alguma instituição os traços de uma determinada linha de pensamento, uma perspectiva que provavelmente nada terá de original e sobre a qual, no exercício filosófico, já foi dissecada em seus mínimos e limitados detalhes.

É o caso do Utilitarismo. Toda forma de pensar, que em filosofia chamamos genericamente de Escola de Pensamento, após ser constituída e divulgada, sofre um processo de análise intelectual chamado em Filosofia de Crítica Filosófica. A palavra crisis em grego quer dizer separação. Criticar, embora entre os leigos no assunto signifique “falar mal de alguém ou de alguma coisa”, em filosofia significa separar em partes para estudar melhor, dividir para entender. Ao criticar uma escola filosófica, os pensadores extraem-lhe seus acertos e seus erros, seus avanços e suas limitações, porque na verdade, toda escola de pensamento está submetida a Dualidade da existência e do pensamento, tendo sempre uma face interessante e outra não tanto. Ao criticar o Utilitarismo reconhece-se a beleza de uma norma como “Agir sempre de forma a produzir a maior quantidade de bem-estar (Princípio do bem-estar máximo)”, associando-a as coisas úteis, racionalmente importantes e de consequências bastante previsíveis, pelo menos em parte; mas surge imediatamente a questão: existirão coisas inúteis que possam causar também grande bem estar, que em princípio não sirvam para absolutamente nada e que, mesmo assim, causem grande bem estar a um grande grupo de pessoas? Sim. E a mais importante delas é a Arte.

Quando um artista pinta um quadro ou um escultor faz uma estátua, em nenhum momento visam o bem da sociedade, em princípio. Claro que gostarão imensamente de ter sua genialidade artística reconhecida mas é consenso que o trabalho artístico profundo é solitário. Antenas da sociedade, artistas captam, antes de todos, como os místicos, imagens e idéias que estão, digamos assim, pairando sobre todas as cabeças sem receber uma forma adequada, uma expressão compreensível. Por que é isto que o artista faz: ele expressa o que antes não tinha sido expresso daquele modo, e partilha com muitos uma percepção a qual, sem aquela expressão artística, na ausência de uma sensibilidade especial que é dada a poucos, não seria percebida ou sequer suposta.

Mais do que qualquer atividade humana, é na Arte que o Utilitarismo demonstra sua maior fragilidade.
Em Arte o princípio da incerteza, da imprevisibilidade e da incapacidade de prever as consequências atingem o clímax. O efeito de uma peça de arte, de qualquer natureza, é imprevisível na linha de tempo. Muitos textos só foram reconhecidos dezenas de anos após a morte dos autores, alguns até séculos depois de seu desaparecimento.

A Beleza não só é aparentemente inútil como também imprevisível, já que se trata de uma percepção estética altamente subjetiva, determinada pelas pessoas que a contemplam e que com ela se relacionam. Só que não é assim. Existe sim uma utilidade na beleza, que é gerar bem estar. Exatamente aquilo que o Utilitarismo busca. Só que é um bem estar não racional, não previsível quanto as suas consequências, sem amarras consequenciais, como uma rede, cujo abalo em qualquer de seus pontos gera vibrações em toda a sua extensão, em todas as direções.



Utilitarismo, como proposto, é uma linha reta encadeada. Arte é multidirecional. Um ponto focal e uma irradiação em todas as direções como uma explosão.

Na verdade a vida comum, cotidiana, encampa estas duas manifestações do real, linhas que se conectam a outras linhas, montando a estrutura de nossa rede imaginária de conexões, esta sim a expressão mais correta da sociedade humana.

E é aí que a pergunta se responde: para que serve a filosofia nos dias de hoje? Ela está em busca da Verdade, como no passado, ou tenta responder as três perguntas mais famosas da Mídia, “De onde viemos, quem somos e Aonde Vamos”?

Nem uma coisa nem outra.

O papel de busca da verdade foi transferido à Ciência, que é quem, hoje em dia, apoiada por uma outra linha de pensamento filosófica, o Positivismo, empreende a busca por uma Epistéme, ou Conhecimento de Certeza, ou para usar um termo Positivista, um conhecimento verificado e comprovado.

Já a busca pelas três consideradas mais importantes questões acima elencadas está também no âmbito de disciplinas científicas: De onde viemos, é o tema da Arqueologia, Antropologia e Cosmologia; quem somos, está a cargo da Psicologia, Biologia e Bioquímica; e finalmente para onde vamos faz parte das questões da Física Pura, da Astrofísica, e da Exobiologia, a área dedicada ao estudo de vida extraterrestre. Sim porque existe vida fora de nosso planeta, não os homenzinhos verdes das ficções mas bactérias, fungos e vírus que podem ter chegado até aqui de carona em algum meteoro.

O que sobrou para a Filosofia? Muita coisa.

Talvez a mais importante seja a capacidade de Criticar ( Analisar) qualquer coisa que o homem faça. E do ponto de vista da Ciência aplicada e da Indústria, visão que aliás é altamente utilitarista, a Filosofia pode ajudar e muito. Porque é a partir da Crítica Filosófica das possibilidades de uma determinado tipo de produto que é possível ao fabricante vislumbrar outras aplicações antes insuspeitas.

É a partir da aplicação da habilidade de instabilização de certezas naquilo que a ciência considera como verdades inabaláveis e comprovadas que os filósofos ajudam cientistas a repensar seu trabalho e redirecioná-lo em sentidos antes não imaginados.

E como isto se reflete na Vida Humana Cotidiana?

Vou dar um exemplo prático. Aplicando o Utilitarismo, as Indústrias criaram sistemas operacionais de produção em série que privilegiaram a reprodutibilidade de um determinado produto a tal ponto que pela enorme quantidade deste produto seu preço se tornasse mais barato e compensador. Esta foi a base do Fordismo, uma visão empresarial criada por Henry Ford , nos Estados Unidos e que por muitas décadas dominou a Indústria Americana e mundial, primeiro quanto a automóveis e depois para praticamente tudo que existe. Com o tempo no entanto verificou-se , após análises dos resultados deste procedimento em larga escala, que ele produzia um efeito colateral antes não percebido: a formação de uma quantidade de produtos excedentes, não absorvidos pelo mercado, e que se tornavam um entrave ao fluxo de bens de consumo. Além disto, para que a fábrica trabalhando em regime de linha de produção pudesse funcionar bem, necessitava de grandes estoques de componentes que participariam da elaboração do produto final. Se lembrarmos do exemplo do carro, as fábricas precisariam de vidro para os parabrisas, peças de borracha, parafusos e porcas. Tudo isto em quantidade suficiente para manter a produção, uma produção que, ao gerar excedente de produtos, levava ao acúmulo também de componentes e ocupava o espaço das fábricas. A Análise criteriosa destes problemas , ou seja, o repensar destes procedimentos geraram novas abordagens e o primeiro exemplo a alteração do chamado Fordismo americano para o Toyotismo japonês. E qual é a diferença? Primeiro: ao contrário do Fordismo, no Toyotismo a empresa não produz todas as peças necessárias ao seu produto final, mas transfere a terceiros as diversas partes desta corrente de elementos necessários a fabricação de seu produto. Um fornecedor fica responsável pelos parafusos e porcas, outro pelas peças de borracha, poutros pelo vidro e assim por diante, num processo de pulverização de funções que em primeiro lugar fez desaparecer os enormes estoques que toda a fábrica tinha que ter pata manter a linha de produção. A fábrica deixou de ser o lugar de fabricação do produto para ser o seu local de montagem. As peças são fabricadas de acordo com a demanda da produção, de forma que, como os estoques de cada fornecedor são infinitamente menores do que o de uma grande fábrica imprimiu-se racionalidade ao sistema produtivo.

Não se iludam, o que mudou não foi a tecnologia mas a Filosofia Industrial. A tecnologia, em seguida, adaptou-se a esta mudança filosófica de administrar. Outro exemplo é a Ecologia. A noção filosófica de Qualidade de Vida não surgiu de forma “dada”.

Na verdade, ele surge de uma série de elaborações filosóficas em textos os mais variados, entre eles um texto de Professor David Alan Crocker, Senior Research Scholar, Institute for Philosophy and Public Policy , em 1993, acerca de qualidade de vida e desenvolvimento . No texto em questão ele pergunta “quais as coisas que nos cercam que são de tamanha relevância que, se elas não existissem, não poderíamos considerar um indivíduo como pessoa”.

                                                              David Alan Crocker

Esta pergunta ecoa até hoje. O que nos faz pessoas? São os bens que possuímos nossas casas, nossas roupas, nossos títulos universitários? Ou é a nossa condição humana valorizada, tanto material como psicologicamente, onde podemos não ter tudo que queremos, mas sentimos que somos tratados com a decência que todos merecemos?

Todos dão a mesma resposta. E isto mudou a maneira de ver o mundo. Não começou aí mas com certeza continuou através deste e de muitos outros textos. Aos poucos foi se criando um consenso, através de multiplicadores, como jornais e revistas, televisões em todo o planeta, de que era possível viver melhor e que isto, viver melhor, não se resumia a aspectos eminentemente materiais, mas também a eles.

Junto houve o despertar da consciência ecológica. Em 1866, um cientista alemão chamado Ernst Heinrich Philipp August Haeckel utilizou pela primeira vez a palavra ecologia. Ele era médico e um artista versado em ilustração que se tornaria professor em anatomia comparada, mas só com o advento do Green Peace, organização criada em 1971 no Canadá por imigrantes americanos,Robert Hunter e Patrick Moore, a palavra ganharia o imaginário popular. Entre Haeckel e Hunter passaram-se 105 anos, e a idéia conceito de estudo do meio ambiente passou a ser uma causa política de defesa deste mesmo meio ambiente com a instauração da noção de risco ambiental.


Os co-fundadores do Green Peace, Bob Hunter, à esquerda, e Dr. Patrick Moore

O tema deste ensaio é a importância da filosofia da vida cotidiana e alguns podem argumentar que neste último trecho não se trata de um exemplo desta natureza. Não é bem assim. A história das idéias e da mudança dos conceitos ao longo da história é também a história da Filosofia. Se, no entanto, preferirem uma relação mais clara entre o pensamento e a ação, sugiro dois temas: por exemplo, a popularização do pensamento cartesiano, de Renée Descartes, e do pensamento de Emanuel Kant.
Renée Descartes (La Haye en Touraine, 31 de março de 1596 — Estocolmo, 11 de fevereiro de 1650) foi um filósofo, físico e matemático francês. É considerado o pai da filosofia moderna porque cria a noçãode que é através do pensamento e da razão que se pode perceber o mundo com clareza. Sua frase mais famosa, “Penso, logo existo”.

                                                              Renée Descartes

Configura a essência de um movimento que revolucionaria o mundo a partir do século 16: o racionalismo. É o racionalismo que fundamenta a mudança gradual de um mundo mergulhado em superstições em um mundo ansioso por idéias “claras e distintas”, oriundas do trabalha intelectual. Desde seus textos, toda a Europa se transformou, passo a passo, até que um movimento social em que o racionalismo foi usado como a base para uma das mais importantes mudanças políticas da história da humanidade derrubou a estrutura da nobreza mais luminosa da Europa, o Rei de França, naquela que se tornou a inspiração para movimentos em todo o mundo de republicanização das relações sociais: a revolução francesa. Ressalte-se, para se fazer justiça, a importância do pensamento de Jean Jacques Rousseau, outro importante filósofo francês nos acontecimentos de 5 de maio de 1789 até 9 de novembro de 1799. É de Rousseau a idéia de Liberdade, Igualdade e fraternidade, que se torna o lema dos insurgentes franceses, e depois do movimento maçônico francês. É verdade que “A reavaliação das bases jurídicas do Antigo Regime foi montada à luz do pensamento Iluminista, representado por Voltaire, Diderot, Montesquieu, John Locke, Immanuel Kant etc. Eles forneceram pensamentos para criticar as estruturas políticas e sociais absolutistas e sugeriram a idéia de uma maneira de conduzir liberal burguesa”. Só que não haveria pensamento racional e nem Ceticismo Inglês, como é o caso de Locke, sem o trabalho de Descartes. E embora Rousseau, ao contrário de Descartes, privilegie a emoção e não a razão, é na combinação de ambos que o movimento francês se fundamenta para revolucionar a sociedade. Sem a paixão rousseauniana e a crítica analítica cartesiana, a França não faria a Revolução. Ele é o organizador do pensamento humano com quatro pequenas regras:

  • Verificar se existem evidências reais e indubitáveis acerca do fenômeno ou coisa estudada;
  • Analisar, ou seja, dividir ao máximo as coisas, em suas unidades mais simples e estudar essas coisas mais simples;
  • Sintetizar, ou seja, agrupar novamente as unidades estudadas em um todo verdadeiro;
  • Enumerar todas as conclusões e princípios utilizados, a fim de manter a ordem do pensamento.

Também devemos considerar o trabalho de Immanuel Kant ou Emanuel Kant (Königsberg, 22 de abril de 1724 — Königsberg, 12 de fevereiro de 1804) foi um filósofo prussiano). “Em 1784, no seu ensaio "Uma resposta à questão: o que é o Iluminismo?", Kant visava vários grupos que tinham levado o racionalismo longe de mais: os metafísicos que pretendiam tudo compreender acerca de Deus e da imortalidade; os cientistas que presumiam nos seus resultados a mais profunda e exacta descrição da natureza; os cépticos que diziam que a crença em Deus, na liberdade, e na imortalidade, eram irracionais.

                                                                Immanuel Kant

Kant mantinha-se no entanto optimista, começando por ver na Revolução Francesa uma tentativa de instaurar o domínio da razão e da liberdade. Toda a Europa do Iluminismo contemplava então fascinada os acontecimentos revolucionários em França.” Mas sem dúvida é pela existência de um precedente filosófico com a obra de Renée Descarte que podemos falar em pensamento racional. Assim, um filósofo estabelece as bases para seu sucessor.
Kant leva essa racionalidade e o estudo da própria razão ao seu nível mais elevado, dissecando-lhe as entranhas em um belíssimo trabalho chamado Crítica da Razão Pura, em 1781.

                                                          Frontispício da “Crítica”

Ali ele demonstra que, filosoficamente, é improvável que conseguíssemos perceber as coisas como são se não houvesse um mecanismo intrínseco que se responsabilizasse pela organização destas percepções em conceitos utilizáveis pela inteligência e que este organizador é inato no homem, o que seria comprovado pela neurologia moderna com a frase “não são os olhos ou os ouvidos que enxergam ou ouvem, mas o cérebro”.  Ele criou uma noção e um conceito que além de fundamentar a neurologia moderna, criou também as bases para o que hoje conhecemos pelo nome de informática: a estrutura interna do computador.

                                                             John von Neumann

Pois a própria idéia de um Unidade Central de Processamento (o CPU, em inglês), lhe deve ser tributada. A idéia surgiu por intermédio de um cientista chamado John von Neumann, nascido Margittai Neumann János Lajos (Budapeste, 28 de dezembro de 1903 — Washington, D.C., 8 de fevereiro de 1957) um matemático húngaro de etnia judaica, naturalizado estadunidense. A maioria dos computadores tem uma arquitetura von Neumann. Mas a idéia de um processador central ( a mente) que processasse os programas dentro da própria máquina é kantiana. Até Kant, achava-se que as idéias ou eram captadas prontas. Ele demonstra que não se trata disso, descrevendo que tudo acontece separadamente: Sensação é o estímulo organizado, percepção é a sensação organizada, concepção é a percepção organizada, ciência é o conhecimento organizado, sabedoria é a vida organizada. O computador moderno tem captadores de informações como o cérebro humano tem seus olhos, ouvidos, nariz e dedos. No caso do computador falaremos de teclados, leitores de antigos disquetes, os discos de CD ROM, ou os modernos pen-drive, pelos quais é alimentado. Mas para que esta informação seja decodificada da linguagem binária e transformada em imagens precisamos do trabalho fundamental do CPU, aonde outros programas pré instalados “lerão” as informações e as transformarão em dados organizados para as nossa contemplação, sejam letras ou imagens. É ele que, graças aos programas pré instalados faz a tradução dos impulsos lidos pelos captadores da estrutura do computador pessoal. Da mesma forma que, para Kant, nas palavras de Will Durant “...a mente do homem,( e aqui está a grande tese de Kant) não é uma cera passiva sobre a qual a experiência e as sensações escrevem sua vontade absoluta e caprichosa; nem é um mero nome abstrato para a série ou grupo de estados mentais ; ela é um órgão ativo que molda e coordena as sensações em idéias, um órgão que transforma a multiplicidade caótica da experiência na unidade ordenada do pensamento” o computador também não recebe de forma passiva as informações com as quais o alimentamos mas as organizada maneira a que possam servir ao usuário. Entre a publicação da “Crítica”(1781) e Neumann publicar o "primeiro esboço de um relatório sobre o EDVAC" onde propunha a idéia do CPU (30 de junho de 1945), passaram-se 136 anos.
Esta conexão entre informática e Immanuel Kant, ainda pouco explorada, serve como encerramento a este breve comentário sobre a importância das idéias e dos filósofos sobre a vida do homem comum. O certo é que, embora não saibamos, nossos lábios apenas repetem suas idéias, de um ou de outro, sem lhes atribuir o crédito. O que falamos e as idéias que defendemos só são possíveis porque, dezenas ou centenas ou milhares de anos atrás alguns destes homens criaram conceitos que são a base de nosso modo de vida e da nossa compreensão do mundo. Ergamos uma taça de vinho em homenagem a eles. E jamais nos esqueçamos de sua importância.

Autor: Mário Sergio Sales
Acessado em: 23/02/2016 às 21h22min