Venezuela vai às urnas em outubro. População decidirá se Hugo Chávez permanece ou não no poder. Apesar dos meses pela frente, algumas polêmicas já afetam a campanha da oposição
O fato pode ser ilustrado pelas campanhas eleitorais no continente. A candidatura de Ollanta Humala no Peru é um desses casos. Derrotado em 2006 quando fundou sua estratégia na política de Hugo Chávez, Humala não repetiu a decisão no pleito presidencial seguinte (do qual saiu vitorioso). Nos meses que antecederam a votação nacional, procurou se afastar do venezuelano e associar sua imagem à criada por Lula na campanha de 2002. Seu slogan era: “a esperança deve vencer o medo”. O caso foi parecido até mesmo na Bolívia, em 2009: no final da trajetória rumo à reeleição, Evo se referiu a Lula em discurso como “o melhor presidente da América Latina no momento”.
O sucesso de um suposto modelo brasileiro que integraria a estabilidade institucional a maciços programas de assistência social parece cativar mais as esquerdas do continente do que o programa estatizante venezuelano. Em parte, pode-se encontrar a razão para isto na abrangência discursiva do governo Lula, que conseguiu manter a associação às classes populares, sem parecer, no entanto, uma quebra revolucionária. Em parte há ainda o peso político do crescimento econômico brasileiro. Enquanto o Brasil apresenta uma taxa de desemprego de 6%, a menor desde 2002, a da Venezuela se concentrou acima dos 10% em janeiro deste ano.
Se nosso país vizinho experimentou uma profunda crise em seu setor elétrico entre 2009 e 2011, que ajudou a aprofundar os efeitos da crise econômica de 2008, nós discutimos no âmbito do Executivo e do Legislativo que destino dar à recém-descoberta do Pré-sal. Não à toa, o desemprego e a crise econômica ajudaram a oposição venezuelana a obter um terço das cadeiras do Parlamento nas eleições legislativas de setembro de 2010.
Porém, mais do que isso, talvez o recente sucesso da oposição nas urnas se explique por uma mudança de estratégia. Em 2006, na última eleição presidencial venezuelana, o candidato oposicionista, Manuel Rosales, ainda que tentasse criar uma imagem de político moderado, tinha contra si o fato de ter sido um dos signatários do Decreto Carmona. O documento instituía um governo provisório após o golpe de Estado de 2002 que depôs temporariamente Hugo Chávez, dando o poder do país ao empresário Pedro Carmona. Em sua plataforma, Rosales ainda reiterava seu compromisso de resguardar a propriedade privada, constantemente questionada pelo governo chavista, e de combater a criminalidade. O discurso conservador, defendido por ele parece não ter surtido efeito, tendo obtido apenas 36,90% dos votos.
O novo candidato da oposição, Henrique Capriles Radonski, busca estabelecer uma nova imagem para a os antichavistas. Conduzindo sua campanha política a partir de grandes comícios, o político tenta conquistar o apoio de setores populares, habitualmente associados ao atual governante. Recentemente, chegou a anunciar que sua inspiração política é o ex-presidente Lula (que apoia a reeleição de Chávez).
Mas, desde já, uma polêmica ronda a candidatura de Capriles. Católico praticante, o opositor é, no entanto, de origem judaica: sua avó materna chegou a passar pelo Gueto de Varsóvia e seus bisavós morreram no campo de extermínio de Treblinka. O fato motivou uma campanha promovida pela mídia estatal venezuelana de que ele seria um agente sionista. Um exemplo desta acusação é o texto escrito por Adal Hernandez, publicado no site da Radio Nacional de Venezuela. Na coluna, Hernandez diz que Capriles teria uma plataforma oposta aos interesses nacionais e pede que os eleitores rejeitem o “sionismo internacional”. O Centro Simon Wiesenthal, com sede em Los Angeles, Califórnia, dedicado ao combate ao preconceito, anunciou que seu diretor de relações internacionais, Shimon Samuels, enviou uma carta ao presidente Hugo Chávez pedindo que ele evitasse posteriores ataques antissemitas contra Capriles.
Além das acusações de natureza religiosa, o oposicionista está sendo alvo de homofobia. Recentemente, Mario Silva, apresentador do La hojilla, um programa de entrevistas e análise política da rede de televisão estatal venezuelana, citou um boletim policial, no qual oficiais afirmariam ter testemunhado o candidato mantendo relações sexuais com outro homem. Capriles negou as alegações.
O ritmo da campanha
De qualquer forma, a campanha já tomou as ruas, em especial depois da vitória de Capriles nas primárias da frente oposicionista Mesa da Unidade Democrática, que decidiram quem seria seu candidato. O fato de ter recebido mais de 62% dos votos não seria tão importante quanto o surpreendente número de votantes. Mais de três milhões de pessoas participaram das primárias de fevereiro e, destas, quase dois milhões votaram em Capriles. No dia 10 de junho, o candidato registrou oficialmente sua campanha à presidência, realizando uma caminhada de 10 km na capital Caracas, a frente de milhares de simpatizantes.
Apesar de despontar como o favorito para as eleições de outubro, possuindo uma vantagem de 17% a 20% sobre Capriles - ao menos de acordo com a maioria dos institutos de pesquisa -, Chávez enfrenta especulações crescentes sobre seu estado de saúde. Tendo se ausentado do país por um considerável período de tempo, a fim de realizar em Cuba um tratamento contra o câncer, o presidente parece assumir um perfil de campanha mais discreto, realizando atos públicos breves e poucas viagens.
Na Venezuela não há voto obrigatório. Por enquanto, as pesquisas apontam que 20% da população vai se abster da participação. Por enquanto, é só esperar.
Por: Alexandre Enrique Leitão
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