segunda-feira, 20 de maio de 2013

A trajetória dos movimentos sociais no campo: história, teoria social e práticas de governos


 
 
 
Um canavial tem a extensão
Ante a qual todo metro é vão.
João Cabral de Melo Neto
 
1. O Rural: Estrangeiro em seu próprio país
É lugar comum afirmar que o Brasil é país de profundas contradições. No meio acadêmico uma das contradições mais intrigantes é a subestimação dos estudos sobre a realidade social do meio rural. O mercado editorial revela o quanto este tema vem sendo relegado dos anos 80 para cá. Os pesquisadores da área procuram dispor informações que possam reverter este cenário de descaso: revelam que a população rural não se reduziu tal como os institutos de pesquisa quantitativa sugerem; que a cultura rural vai se tornando hegemônica na produção cultural nacional; indicam a pujança dos movimentos sociais. Mesmo assim, o caráter quase exclusivamente urbano das pesquisas sociais nacionais gera uma barreira analítica. O que nos impede de perceberemos as origens da cultura hibrida do brasileiro. Somos “rururbanos” na alma: meio tradicionais e meio modernos, somos transgressores sem romper com a ordem social, somos místicos e declaradamente pragmáticos. Os movimentos sociais brasileiros são nitidamente comunitaristas, marcados por uma sociabilidade tipicamente rural, mesmo aqueles com longa trajetória de lutas urbanas. Não por outro motivo, a organização social com maior poder de mobilização do país é o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. Mas no meio rural encontramos, ainda, as inovações sociais e políticas mais significativas: as lutas pela sustentabilidade econômica, os enfrentamentos de natureza estrutural em relação aos projetos governamentais (como é o caso da transposição do Rio São Francisco), os modelos de gestão participativa mais radicais (como os processos de reassentamento rural nos casos de construção de barragens), os projetos de combate à pobreza (como a construção de cisternas na região do semi-árido).
Estrangeiro em seu próprio país, o mundo rural continua exótico, estranho para grande parte dos brasileiros, incluindo nossos pesquisadores sociais. Daí não compreendermos claramente os movimentos erráticos dos movimentos sociais rurais. Se nos anos 80 alguns estudos sugeriam uma novidade social que vinha do campo, rompendo com os mandonismos locais, no início do Século XXI já era perceptível que a novidade se transmutava, revelava ambigüidades, caminhava sob lógicas pouco coerentes. Citemos como ilustração, algumas dessas ambigüidades:
a) Apesar do movimento sindical de trabalhadores rurais ser o mais vigoroso de toda estrutura sindical nacional, os movimentos sociais rurais, com raras exceções, permanecem organizados ao largo da estrutura sindical;
b) Apesar do movimento social de luta pela terra se constituir no maior foco de resistência política e social do país, grande parte desses movimentos foram se cristalizando em organizações estruturadas e hierarquizadas, alterando paulatinamente seu ideário político e se tornando auto-referentes;
c) Embora a quase totalidade dos movimentos sociais rurais serem oriundos das comunidades eclesiais de base ou similares, ao longo dos anos 90 as divergências de condução entre agentes pastorais e lideranças sociais rurais foram tomando corpo e volume;
d) Não obstante os conselhos municipais de desenvolvimento rural sustentável se consolidarem como uma das experiências de gestão participativa mais intensas e de envolvimento de comunidades do país, não conseguiram romper com a ingerência do Poder Executivo local nas suas deliberações.
A ambigüidade, ou melhor, a ambivalência da cultura política rural parece ser uma marca nítida das ações do homem do campo. Uma característica da cultura rural: uma cultura não hegemônica, desprezada (a despeito de sua pujança) pelo centro político e econômico do país, inferiorizada e que resiste a esta condição, mas que se traduz numa forte hierarquia social no seu interior, formalizada em rituais e tradições definidas pela conduta e costume. A resistência e a tradição andam ao lado da transgressão, ressentimento e revolta. Esta condição leva ao apartamento social e daí as ações de resistência política sempre estarem revestidas de transgressão ou inovação na gestão territorial. Daí a explicação para saques em regiões de seca, ocupações de terra, ocupações de órgãos públicos, co-gestão de projetos sociais.
O novo, no mundo rural, é revolucionário e conservador.
 
2. De Organizações e Movimentos Sociais
 
As organizações sociais rurais contemporâneas, que lideraram lutas de resistência política desde meados do século XX, foram marcadas, desde seu inicio, pela ambigüidade. As duas mais importantes organizações rurais dos anos 50 e 60 (Ligas Camponesas e Sistema CONTAG) sofreram desta sina. As Ligas Camponesas nasceram como Sociedade Agrícola de Plantadores e Pecuaristas de Pernambuco (SAPPP), mas logo foram cunhadas pelos jornais locais com o nome das organizações rurais comunistas criadas nos anos 50 na região de Ribeirão Preto (SP), para qualificá-las ideologicamente (RICCI, 1999: 67). Logo em seguida, o deputado estadual Francisco Julião criou um comitê de apoio envolvendo PTB, PST, UDN e PSB e se tornaria sua principal liderança. Julião protagonizaria embates acirrados com a direção do PCB sobre a condução das lutas no campo e acabaria por dirigir uma radical inflexão de seu ideário, aproximando as Ligas das políticas castristas, alinhando-as à Cuba.
A CONTAG teve sorte semelhante. Nascida através da disputa e negociações de cúpula entre lideranças do PCB, lideranças conservadoras da igreja católica e Ação Popular, a confederação foi criada em 1963, tendo como presidente Lindolfo Silva (um alfaiate carioca comunista que desconhecia o cotidiano rural). O PCB, na época, dirigia 21 federações rurais (de um total de 42 existentes). Após o golpe militar de 64, a CONTAG será reconquistada por lideranças vinculadas ao PCB apenas no final da década de 60. E, novamente, emerge a ambigüidade cultural, já que a cúpula de esquerda do sistema sindical rural define como estratégia política a orientação pela defesa restrita da lei (lembremos que a legislação vigente era draconiana contra qualquer mobilização social de massa) e estabelecimento de acordos entre lideranças sindicais já estabelecidas (mesmo entre dirigentes muito conservadores), compondo “laços de lealdade” no interior do sistema sindical. Daí a emergência do que poderíamos denominar de “culto aos dirigentes”, como administradores e representantes capacitados para liderar e monopolizar qualquer demanda social rural.
No final dos anos 70 e inicio dos 80, esta limitação do sistema de representação político-social do meio rural foi duramente questionado por uma série de movimentos sociais que explodem nas regiões e categorias sociais de fronteira, pouco ou nada assistidas pela legislação ou estrutura sindical vigentes. Este é o caso da luta pela terra (defendida pelo sistema contaguiano apenas nos limites do Estatuto da Terra, o que excluía a luta de ribeirinhos, seringueiros, sem-terra e bóias-frias), lutas de assalariados rurais temporários e tantos outros segmentos sociais.
Os movimentos sociais rurais dos anos 80 são, portanto, um campo de dupla resistência política, contra a ordem social que os exclui e contra as organizações formais de representação social que não os acolhe. A resistência, assim, é embalada por forte ressentimento, que busca amparo na leitura da Bíblia, em especial, as passagens do Êxodo, que trata da busca de um povo excluído e solitário por uma terra prometida pelo desejo divino. O misticismo retorna como energia moral de segmentos sociais que se sentem abandonados. Daí seu nítido caráter autônomo, frente aos partidos políticos e estruturas formais de representação. Daí o discurso inundado de simbologia, a natureza teleológica (quase proféticas) das palavras de ordem. Daí a preferência por estruturas de organização horizontalizadas, o assembleísmo na tomada de decisões, a forte desconfiança em relação às instituições públicas. Um ideário de distanciamento do instituído e de crença num futuro utópico.
3. De Movimentos Sociais à Organizações
O ideário anti-institucionalista projetado nos anos 80 consolidou uma forte articulação nacional de movimentos sociais e organizações de apoio às lutas sociais rurais. Contudo, não conseguiu elaborar uma nova institucionalidade ou mesmo políticas públicas mais adequadas aos seus interesses. Permaneceram na resistência e na mobilização por pautas mais imediatas. Mesmo algumas inovações implementadas a partir das novidades instituídas pela Constituição de 1988 (mais especificamente os conselhos de gestão pública gerados a partir do artigo 204), não conseguiram esgotar sua possibilidade real de substituir a estrutura verticalizada e burocratizada de gestão pública por estruturas mais horizontalizadas e colegiadas, como é o caso dos Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural Sustentável (CMDRS). Com efeito, estudos de Marta Arretche (2000) demonstram que persiste na cultura política nacional a dependência das ações públicas em relação aos órgãos centrais de gestão. Este seria o caso das políticas de descentralização ocorridas no país (merenda escolar, saúde, assistência social, entre outras), que envolveram estados e municípios na medida em que o órgão central gerava estímulos financeiros. Este foi o caso do CMDRS, que em grande parte foram criados a partir do estimulo gerado pelos recursos envolvendo o PRONAF (Programa Nacional de Apoio a Agricultura Familiar). Esta situação parece estar sendo contornada por ações recentes do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), que reformularam a política nacional de assistência e extensão rural, aumentando o apoio e as ações de formação técnica dos conselheiros rurais. Entretanto, a regra continuou sendo a dificuldade das ações de resistência e luta por novos direitos superarem os limites das praticas reivindicativas, construindo uma nova institucionalidade pública, uma nova estrutura de poder e tomada de decisão pública.
As dificuldades para a superação do caráter reivindicatório não estiveram vinculadas apenas à cultura ou ideário político dos movimentos sociais, mas à uma conjunção de fatores: o avanço do agronegócio em áreas tradicionalmente ocupadas pela agricultura familiar, o envolvimento direto de assessores e lideranças de movimentos sociais em administrações públicas progressistas, o aumento de disputa por recursos entre movimentos e organizações populares. Assim, muitos movimentos sociais rurais se institucionalizaram e assumiram nítidos sistemas de controle e hierarquia no seu interior, transformando-os em organizações autoreferenciadas. Como organizações, passaram a locomover-se num cenário de autopromoção, deixando de realizar cursos e atividades de formação abertas, para limitá-las à formação de seus próprios quadros, passaram a definir dirigentes autorizados a falar em oficialmente em nome das organizações, criaram sistemas de divulgação de suas ações e captação de recursos financeiros, e assim por diante. A própria filiação da CONTAG à CUT gerou um declínio de todas formas de organização paralela à estrutura sindical federativa que estava em curso até meados dos anos 90. Permaneceram algumas experiências singulares e particularizadas, como as federações de agricultores familiares, mas que não chegaram a alterar, de fato, a estrutura sindical centralizada e pouco enraizada no cotidiano das lutas sociais no campo.
Enfim, em grande parte, as experiências inovadoras desencadeadas pelos movimentos sociais rurais dos anos 80 foram catapultadas à esfera das ações governamentais. Tal constatação não se confunde, é certo, com cooptação das experiências, mas com o que podemos denominar de “estatalização” dos movimentos sociais: um tipo especifico de parceria que tende a institucionalizar os movimentos sociais numa dimensão extremamente formal e oficial. O que merece destaque é a relação direta entre lideranças de movimentos sociais e governos (e nem tanto entre movimentos sociais e Estado), consolidando uma relação política e não necessariamente uma nova institucionalidade pública. Nesses termos, o PRONAF parece ser a referência mais direta e exitosa desta nova relação política, o que se distancia do caráter emancipatório dessas políticas e ações governamentais.
Com efeito, estudo recente a respeito do PRONAF (SCHNEIDER, 2004) revela a pujança e caráter inovador deste programa. O PRONAF adotou quatro objetivos centrais: a) adequar políticas setoriais à realidade da agricultura familiar; b) viabilizar infraestrutura para este segmento social; c) elevar o profissionalismo dos agricultores familiares e; d) estimular o acesso aos mercados de insumos e produtos, operacionalizados a partir do financiamento da produção, financiamento da infraestrutura, formação de profissionais e financiamento da pesquisa e extensão rural (SCNEIDER, CAZELLA & MATTEI, 2004:24). Uma importante investigação sobre o funcionamento de CMDRS do Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Paraíba (MARQUES, 2004: 54) indica algumas características desses organismos de gestão pública:
a) A paridade na sua composição, entre representantes das comunidades rurais e agentes governamentais, parece provocar disparidades na capacidade de tomada de decisões dos CMDRS. Enquanto os primeiros participam como voluntários, os segundos possuem condições materiais (incluindo salário) que lhes confere mobilidade;
b) Não é freqüente, como seria adequado, que o presidente dos CMDRS sejam eleitos por seus pares;
c) Não existe uma concepção nítida do que seria a estrutura mais adequada de participação das comunidades rurais nos CMDRS. Em alguns casos, técnicos da EMATER (extensão rural) entrevistados consideram que um número elevado de conselheiros e representantes de cada comunidade dificulta a agilidade das decisões;
d) A composição dos CMDRS não é uniforme ao longo do país. Contudo, a presença dos Sindicatos de Trabalhadores Rurais (STR) e de associações de agricultores familiares (ou suas comunidades), é uma constante. Em alguns casos, representações do empresariado são incorporadas aos conselhos (caso mais freqüente no Rio Grande do Sul), assim como igrejas (caso mais freqüente na Paraíba). Há registros de embates sociais para ingresso nos conselhos, como vários casos envolvendo assentados rurais;
e) Os CMDRS valorizam o saber prático, o que questiona, muitas vezes, o saber técnico da representação governamental (em especial, dos técnicos presentes). Os embates de ordem cultural são constantes. Não é raro extensionistas rurais selecionarem conteúdos e formulações dos conselhos do que consideram ilusório ou irrealista (MARQUES, 2004: 69). O despreparo de agentes das Secretarias Municipais de Agricultura ou descaso de prefeitos limitam, muitas vezes, a capacidade política dos conselhos (contudo, no Rio Grande do Sul, 57% dos presidentes dos CMDRS são secretários da agricultura; na Paraíba, há registros de ingerência direta do Poder Público local na definição de representantes das comunidades rurais como conselheiros).
Uma outra esfera de atuação governamental – as políticas agrárias – não mereceu a mesma atenção e lógica adotada pelo PRONAF. Ao contrário, desde os anos 80, a reforma agrária foi deslizando da agenda oficial dos partidos e das preocupações centrais da agenda estatal. Associou-se à histórica oposição do empresariado nacional a reelaboração teórica promovida inicialmente por José Graziano da Silva (1985). De política estatal de natureza distributiva que teria como função corrigir distorções na ocupação da terra e natureza da estrutura produtiva rural, a reforma agrária passou a ser considerada como política compensatória ou ação focalizada para debelar tensões em áreas de conflito social. Ao longo dos anos 90, o novo contorno da política agrícola foi se acentuando e descaracterizando os objetivos tradicionais da reforma agrária. No governo Lula, a reforma agrária passou a ser substituída pelo fomento ao desenvolvimento territorial. É fato que esta substituição é tema de embate político no interior do governo, mas os agentes estatais que sustentam a tradicional versão da política de reforma agrária são francamente minoria no interior da gestão federal.
Uma última observação sobre as políticas estatais para o meio rural e a relação com movimentos e organizações rurais diz respeito à focalização de diversas iniciativas como é o caso da transposição do Rio São Francisco. Tanto a territorialização, quanto as demais ações governamentais voltadas para o fomento à agricultura (em especial, a agricultura familiar), com exceção do PRONAF – já comentado – possuem contornos das políticas focalizadas, não universais. Esta parece ser uma lógica que mantém, de um lado, a redução das políticas públicas para o setor à sua dimensão econômica; de outro lado, é possível, ainda, sugerir referências à noção de formação de clusters. As duas hipóteses indicam, se corretas, o caráter facilitador de realização do capital e dos investimentos no setor.
É fato, contudo, que a focalização não se tornou, até o momento, uma leitura governamental unificada, embora hegemônica, dirigida pelos formuladores do Ministério da Fazenda.
Os movimentos sociais rurais, e mais especificamente, as organizações rurais de trabalhadores e agricultura familiar, têm neste enredo um dilema a ser superado: ou disputam programas marginais que indicam mudança na lógica de fomento ao desenvolvimento da agricultura ou aumentam o grau de mobilização social e pressão sobre as agências estatais. A primeira opção foi, até o momento, a escolha, ainda que tímida, que grande parte dessas organizações trilharam. Tal escolha, contudo, parece se esgotar gradativamente
 

4. Da crise de paradigmas e de representações sociais

A historia recente dos movimentos sociais rurais, como se percebe, é tortuosa e errática. Pareciam anunciar novas práticas políticas e sociais nos anos 80, mas rapidamente tomaram novos rumos, se institucionalizaram, alguns se partidarizaram, outros mantiveram o ideário original (mas restrito à pequenos territórios de atuação) ou até mesmo mantiveram ações inovadoras temáticas (como no caso de reassentamentos rurais de populacões atingidas pela construção de hidrelétricas). Mas não conseguiram produzir – nem prática, nem teoricamente – um esboço de nova institucionalidade pública ou padrão de formulação ou controle social sobre políticas públicas do setor, como era anunciado em diversos estudos elaborados ao longo dos anos 80 e 90.

Além do hibridismo (ou ambivalência) da cultura política rural, outros fatores competem para a contenção ou inflexão dos movimentos sociais rurais brasileiros. A mais instigante hipótese é a de crise das estruturas de representação política no meio rural em virtude de mudanças aceleradas das condições sociais e de trabalho no campo. A fragmentação social, a mudança constante da paisagem rural, a crise das relações sociais tradicionais, contribuem para uma constante tensão entre uma identidade tradicional das populações rurais e um panorama inovador e volátil que conspira contra as bases de seu imaginário. Num terreno social, ideológico e econômico como este, as possibilidades e impactos sofridos pelas populações rurais gera o que podemos denominar de “tendência à dissocialização”, para utilizarmos termo sugerido recentemente por Touraine (1999).

É importante ressaltar que toda representação social é mutável, se inscrevem nos quadros de pensamento preexistentes e enveredam por uma moral social (JODELET, 2001: 20), não raro acolhendo várias representações de natureza distinta que acabam por criar novos elementos morais, dando lugar a teorias espontâneas. Em suma, as representações incorporam diversos elementos da vida cotidiana (informativos, cognitivos, ideológicos, normativos, crenças, valores, atitudes, opiniões, imagens), num mosaico de informações que constituem um tipo de bricolage, o que confere o deslocamento de certezas e verdades sociais, alterando o sentimento de pertença social e o julgamento das experiências cotidianas. As representações sociais, enfim, articulam conteúdos e processos. No caso em estudo, as comunidades rurais vivenciam um momento de “deslocamento de representações” em virtude da flexibilidade da ordem social contemporânea. Nada mais natural, portanto, que sugerirmos um importante momento de crise de representação social.

A cultura comunitária, enfim, não consegue impor-se como alternativa à constante ruptura social e de expectativas futuras. Enquanto tendência, contudo, pode gerar inovações. Mas, para tanto, as populações rurais terão que atualizar a trincheira aberta nos anos 80, de formação de uma forte identidade e valorização das populações rurais, de compreensão do seu isolamento frente às opções governamentais e de construção efetiva de uma nova institucionalidade pública, que considere seu ideário e imaginário social e suas formas de reprodução social. A capacidade de formulação de políticas públicas e controle social rural era, e se mantém, como possibilidade afirmativa do mundo rural tal como elaborado pelos movimentos sociais rurais dos anos 80. Para além do Estado ou para transformá-lo radicalmente.
Por:  RUDÁ RICCI
 

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