terça-feira, 16 de abril de 2013

TER x SER

RÓTULOS HUMANOS


Rótulos são essenciais para denominar os remédios. Já pensou tomar um medicamento para soltar o intestino, quando ele já está serelepe? Ou confundir a pílula anticoncepcional com um comprimido contra enxaqueca? Sem esses rótulos, teríamos caos e perigo.
Etiquetas são perfeitas para organizar papelada, pastas, contas a pagar e a receber. Também ajudam na governança da cozinha. Evitam confundir açúcar com sal, farinha de trigo com a de mandioca. Pimenta de cheiro com a malagueta. Quiabo com o diabo.
Daí, rotular e etiquetar são excelentes invenções. O prejuízo começa quando estendemos a prática do carimbo para as pessoas. Pois nomear de forma taxativa só serve para limitar, culpar, discriminar. Apesar de ser um carimbo sem tinta, faz um borrão danado.
José gosta de se vestir com roupas de mulher. Portanto, ganhará o rótulo de travesti. Mas José tem várias outras dimensões. Ele pode cantar bem, ser um exímio ciclista, um sujeito solidário como poucos. No entanto a etiqueta travesti se sobreporá a tudo mais que José seja.
Maria teve paralisia infantil. Hoje, aos 60 anos, segue mancando e se locomove com duas muletas. Ela ganhou a etiqueta de deficiente. Ao lado disso, ela é uma competente advogada. Andou trabalhando na ONU, em Nova York. Mas o rótulo deficiente se sobrepõe a tudo o que Maria faz.
Assim acontece na escola, no trabalho, na vida. O colega recebe a pecha de chato, mesmo que além disso seja gentil e criativo. A aluna é reduzida pelo apelido de periguete, quando ela também é estudiosa e curiosa.
Fulano é autista, sicrana fala errado, beltrano é fanho. Sem ser remédio, pote de ervilha, pasta de papel, eles vão carregar sobre seus ombros rótulos redutores. Viram peixinhos em um aquário mínimo, expostos à maldade pública.
Então vamos parar com isso! Qualquer pessoa é muito mais do que sua condição física ou mental, sua orientação sexual, seu bom ou mau português. Como escreveu e cantou Caetano Veloso: "Gente é prá brilhar." E podemos agregar: Testa de gente não foi criada para levar carimbo.
 Por Fernanda Pompeu 

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